Que eu me lembre, desde criança sempre fui do agito. Minha avó dizia que eu não andava, corria. Cheguei a perder alguns dentes de leite correndo e me estabacando. Para não falar de algumas cicatrizes que vieram com as quedas.
A idade faz a gente tentar se conter, falar mais devagar, pensar com mais calma, calar mais vezes. O que é ótimo, porque nos torna mais consequentes e conscientes de nossas ações e escolhas.
Mas eu continuo precisando do movimento para viver. Pra facilitar, meus principais signos astrológicos (Sol, ascendente, Lua) são cardinais, os que precipitam a ação. Sei que tem gente que precisa ficar quietinha num canto pensando sobre o que fazer, qual o próximo passo a dar (e juro, estou aprendendo a respeitar esse outro ritmo). Eu fico algum tempo assim, quieta, penso, choro, rumino, reflito, mas logo percebo que tenho de colocar algo em movimento. Antes eu achava que era apenas a mim mesma que eu movimentava; agora percebo que é a vida. Porque vi que na minha vida as coisas assim se dão: mais faço, mais acontece; nada faço, nada acontece. Ação e reação.
Claro que hoje tento não "agir por agir", fugindo assim à reflexão essencial que as crises trazem. No entanto, mesmo quando estou arrastando os pés presos a bolas-de-ferro-de-tristeza, procuro prosseguir com aquilo que me faz bem, além de redobrar o foco no trabalho. E percebo como a tristeza, mas não a reflexão, vai se esvaindo aos poucos. E de repente coisas alegres surgem na minha frente, possibilidades mil, a chance - imediatamente agarrada - de realizar antigos sonhos. As questões da vida repentinamente se iluminam de sol. A tristeza pode estar ali, mas faz tanto, tanto sol que ela se encolhe num cantinho, com seus óculos escuros de viúva triste.
Um dia desses, li um texto sobre faxina emocional, tema que tem me interessado em particular. E de novo, lá estava essa imagem do movimento necessário - o processo psicanalítico era comparado a caminhar pelo inferno (como também me lembra meu terapeuta): de preferência não apenas em círculos, sem sair do lugar, embora, como o autor bem lembrou, a imagem infernal tradicional seja circular (e viva Dante por seus insights).
Pensar nisso tudo (porque a mente também não para) me fez lembrar de Aristóteles, o discípulo de Platão. Com todo respeito que tenho pela alegoria da caverna, pelo mundo ideal e coisa e tal, acho que, tivesse eu vivido na Grécia antiga e o contexto não fosse de total misoginia, seria da turma dos peripatéticos. Sairia com eles caminhando e aprendendo à medida que caminhava, com as acaloradas e ricas discussões entre nós. Contudo, acho que em pouco tempo arrumaria minha malinha e sairia andando, aprendendo/apreendendo outras paragens, além-Grécia, além de mim.
quarta-feira, 30 de outubro de 2013
domingo, 20 de outubro de 2013
A música épica da Esperança
Este blog estava meio abandonado, depois de alguma (muita) tristura. Talvez por coerência: nada estava soando aqui dentro, tudo um grande silêncio, só ecos de passos arrastados num corredor escuro e antigo.
Aí escrevi sobre o aniversário de 80 anos dos queridos pais de uma amiga querida, no Nem guerê nem pipoca, e também sobre seu amor longevo. Uma amiga, a Simone Adami, a quem enviei o link, leu o texto e escreveu no Facebook um outro, maravilhoso, sobre o amor e outros bichos. E disse ainda que lendo ESTE blog aqui se viu querendo voltar a ser, e não apenas a soar.
Puxa, são gentilezas assim que me fazem pensar nesse poema de Quintana, tão conhecido da época do trabalho no cursinho:
Esperança
Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se
E
— ó delicioso vôo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança...
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...
Coisas assim, palavras assim me trazem à mente a imagem da humanidade como um intrincado conjunto de címbalos, tocando uns aos outros, fazendo soar uma grandiosa, enorme melodia. Soam e ressoam no íntimo, fazendo brilhar ali a luzinha dos olhos verdes da Esperança, oculta sim, mas viva, viva.
Aí escrevi sobre o aniversário de 80 anos dos queridos pais de uma amiga querida, no Nem guerê nem pipoca, e também sobre seu amor longevo. Uma amiga, a Simone Adami, a quem enviei o link, leu o texto e escreveu no Facebook um outro, maravilhoso, sobre o amor e outros bichos. E disse ainda que lendo ESTE blog aqui se viu querendo voltar a ser, e não apenas a soar.
Puxa, são gentilezas assim que me fazem pensar nesse poema de Quintana, tão conhecido da época do trabalho no cursinho:
Esperança
Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se
E
— ó delicioso vôo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança...
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...
Coisas assim, palavras assim me trazem à mente a imagem da humanidade como um intrincado conjunto de címbalos, tocando uns aos outros, fazendo soar uma grandiosa, enorme melodia. Soam e ressoam no íntimo, fazendo brilhar ali a luzinha dos olhos verdes da Esperança, oculta sim, mas viva, viva.
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