terça-feira, 18 de junho de 2013

Pretinho básico, ou Olha como sou legal!

Com essa história de terapia, vou tendo vários insights, alguns tardios, mas fazer o quê? Antes tarde, não é isso? Antes aos 40 do que nunca.
Um desses insights foi sobre o pretinho básico, aquele vestido que toda mulher TEM que ter. De fato, é muito prático ter um no guarda-roupa. Eu me rendi a isso bem recentemente, pois sempre tive muita dificuldade em resistir aos vestidos cheios de cores e estampas. Afinal de contas, um pretinho básico nos deixa adequadas a qualquer ocasião. Basta acrescentar o acessório certo, o sapato correto, et voilà, as portas se abrem (ou, pelo menos, não se fecham).
Mas o fato é que os pretinhos básicos uma hora se vão, de tão usados em todas as ocasiões que pedem atitudes discretas e adequadas. E quando saio para comprar outro, acabo voltando com um... pouco básico. Pode até ser preto (cor que, aliás, adoro), mas sempre terá um detalhe que não o deixará combinar com tudo.
E cadê o tal insight? Ah, sim: um dia desses, estava arrumando o guarda-roupa, verificando se havia algum vestido que deveria doar. Então me dei conta de que não tinha nenhum pretinho básico, que todos os subsistentes eram mais ou menos coloridos. Cheguei a cogitar que precisava de um novo vestido preto, bem "normal", mesmo que a ideia não me parecesse tão animadora. E pensei em seguida como muitas vezes nos forçamos a encarar algo que não nos apetece para nos sentirmos apropriadas, aceitas.
Quantas vezes nos transformamos num modelo básico de comportamento para agradar à maioria das pessoas? Acabamos nos tornando nós mesmas um pretinho básico que se adorna com o acessório correto para cada ocasião - para não fazer feio, não escandalizar, não provocar comentários. Em suma: para passar batido. Não incomodar.
Embora eu prefira as estampas e cores, já me peguei muitas vezes me adaptando demais a situações e pessoas. Aceitando/engolindo falas e condições absurdas de parceiros, fazendo coisas para agradar ao mesmo tempo que rangia os dentes. Como se estivesse dentro de um vestido que me constrangesse (como as roupas que às vezes herdava dos irmãos mais velhos, oh God!), ou com sapatos muito apertados. O mais maluco é como essa situação incomoda e como é difícil nos livrarmos dela. É angustiante saber o que se deve fazer e se sentir impotente para fazer. A alma está sendo torturada, e a mente (ou o ego, ou o animus, ou a persona, ou as convenções, sabe-se lá) diz: aguente firme. Será que TEMOS que aguentar? E não estou nem pensando em mim, nos meus sapatos apertados, quando escrevo isso, mas em amigas que estão neste momento sendo esmagadas por uma situação, que sentem os ossos quebrando, mas ainda não conseguiram sair de baixo dos escombros. Tenho certeza de que conseguirão, que vão soltar um grito (exatamente como uma amicíssima fez) de basta, no meio da noite, para todo mundo (principalmente elas mesmas) ouvir.
Não por acaso, depois de um café com duas outras grandes amigas (já se vê que este post é para minhas amigas, e para as mulheres em geral), falando de tudo um pouco, mas principalmente sobre nossa condição feminina, uma delas compartilhou o pdf do livro Mulheres que correm com lobos (minha amiga que uivou pelo fim de sua situação já tinha falado dele há alguns anos, mas não me animei na época com o título piegas) da junguiana Clarice Pinkola Estes. Bom, o livro é mesmo um pouco piegas, e seu tom de autoajuda (muitas repetições, um certo didatismo, muitas metáforas) às vezes cansa um pouquinho. De qualquer modo, é MUITO pertinente a toda essa história de se ajustar para agradar, vestir uma pele que não é nossa, ou perder a pele até ficar ressequida, à mercê das intempéries e maus-tratos (como a história de uma mulher-foca contada pela autora).
Depois de alguns insights como esse, tenho me olhado com mais atenção no espelho (= alma) para ver o que me serve ou não. O que reflete o que sou, e não o contrário, para que não aconteça o que sucedeu à personagem Jacobina, de Machado de Assis. Provavelmente terei um pretinho pouco básico no guarda-roupa, provavelmente me acharão menos "legal" por não seguir as regras de comportamento. Mas certamente estarei mais feliz.